segunda-feira, 11 de fevereiro de 2008

Woodstock

Sou feito de madeira. É verdade; suspeitava-o há anos; descobri-o há dias.
Desde os tempos em que o meu pai me pregava (literalmente) à cadeira quando me recusava a comer a sopa até ao fim, e a minha mãe me chegava fogo ao cabelo quando tirava notas abaixo de 4 no ensino básico, que suspeito ser da mesma essência das árvores (e da casa do porquinho do meio).
Depois chegou a adolescência e a minha suspeição viu-se cada vez mais fundamentada. A minha pele tornou-se mais rugosa (não gosto de me gabar, mas arrisco dizer que com um ligeiro "toque" do mais fino pinho), e quando a jogar à bola, os meus colegas diziam que “tinha pés que mais pareciam tábuas”.
Agora, em pleno test-drive da vida adulta, vejo provada a minha teoria. Como a madeira, passo a vida teso e sem onde cair morto, e as mulheres acusam-me de uma insensibilidade e de uma preocupante incapacidade de agir, tão habitual nas matérias mortas. Por fim, como é apanágio das árvores e seus derivados, também eu atraio bichas quando vou sair à noite.
Enfim, se alguém estiver interessado nuns bonitos brincos de madeira, tenho um dedo para vender…

sexta-feira, 8 de fevereiro de 2008

The World is Yours

Há meses acordei com uma fulminante dor de cabeça. Tratava-se de um novo sonho a formar-se. Recostei-me na cama, tomei dois tragos do rico ar, e deixei as ideias assentar. O sonho desvendara-se: queria ser Chefe do Mundo.
Sonhava ordenar, ser respeitado, amado e temido. Ter acesso a mundos e fundos; mulheres, terras, barcos (?), e toda a colecção do MacGyver em DVD.
Os meses passaram, os exames vieram, as notas seguiram-se, e o sonho cedo se desvaneceu. Chefe de mesa já serviria…
Há semanas, enquanto ouvia uma ou outra faixa do Tom Waits, o mesmo se sucedeu: um novo sonho se formava na minha cabeça.
Desta vez precisei de bem mais que o rico ar para fazer as ideias assentar, e só depois de uma injecção de morfina na testa, o novo sonho se clareava. Sonhava agora ser um ilustre bêbado: amado por muitos, odiado por outros; admirado por uns tantos, e roubado à má fila pelos amigos do alheio que vagueiam pelo metro.
Em casa, acercado de uma garrafa do mais cáustico rum, comecei a laborar em prol do meu mais recente sonho; mas cedo desisti. Não tolerava o enjoo, e começara uma doentia discussão com um guardanapo. Isto ainda sem sequer ter acabado de extrair a rolha.
Há dias um novo sonho me fulminou. Sonhava agora ser um poderoso industrial, produtor de sabonetes. De novo, cedo o abandonei. Confiar-me questões de higiene seria como confiar num barbeiro careca; seria como confiar num dentista sem dentes; seria como confiar uma adega ao Manuel Vilarinho…
Enfim, deixei-me de sonhos.
Uma vez lowlife, para sempre lowlife